sábado, 15 de novembro de 2014

LE MARIAGE DE FIGARO: encontros inspiradores para a montagem da peça «Auto da Compadecida» de Ariano Suassuna


  • Ateliê de 3-11-2014 - Diário de Bordo
Nesta segunda-feira, sob chuva intensa, estivemos no anfiteatro da escola onde podemos ouvir e questionar o encenador da peça «As Bodas de Fígaro» (cuja representação iremos ver no dia 22-11-2014) e o ator que representa Fígaro. Aqui ficam algumas notas tiradas nesse encontro onde nos foi explicado como trabalham os atores, o encenador, por que foram feitas determinadas escolhas na criação da peça...

- quando se encena uma peça há que ter em conta três elementos fundamentais: o que se conta, a quem se conta e como se conta;

- quando se encena uma peça, cria-se sentido

- a encenação de uma peça é um trabalho coletivo e nunca individual;

- o essencial na encenação desta peça foram as falas daí o cenário acabar por ser minimalista, não era de todo o mais importante para Jean-Paul Tribout (JPT) que considera a mecânica da ação criada por Beaumarchais perfeita;

- sobre o texto de Beaumarchais podemos de facto dizer que no início a leitura pode ser algo confusa, complicada;

- podemos reter que Beaumarchais faz nesta sua peça, a segunda de uma trilogia, o elogio da meritocracia e defende a igualdade de oportunidades, defende-se a ideia de não olharmos para as nossas origens mas antes para onde vamos, devem julgar-se os homens com base nas suas competências e não com base nas suas origens; nesta peça há igualmente um discurso feminista onde se destaca com a personagem de Marcelina a desigualdade de que são vítimas as mulheres;

- para um ator, o trabalho no palco é fundamental, mesmo se por trás pode haver (tudo depende dos atores) alguma pesquisa sobre a personagem que se tem de representar;

- é preciso ter consciência que a encenação é algo de bastante recente e os atores investem-se ao lado do encenador a quem não se devem submeter, mas antes escutar e eventualmente colaborar com ele;

- o ator que representa Fígaro nesta peça considera o seu papel exigente, rico, uma personagem que tomou consciência de si e da classe social a que pertence, age para bem de si próprio e não para o seu amo (um dos factos que levou Luís XVI a proibir a peça);

- sobre a arte de representar, o ator de Fígaro considera que os pequenos papéis são mais difíceis do que os papéis longos (a dificuldade destes reside mais na memorização);

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  • Ateliê de 14-11-2014 - Diário de Bordo 
Nesta sexta-feira, treze alunos da turma deslocaram-se ao TAD (Théâtre Alexandre Dumas) onde pudemos ouvir Amélie Tribout que nos explicou, com a ajuda dos dois pintores que com ela trabalharam, de que forma escolheu e pensou no cenário da peça. Também nos foi referido algo sobre a escolha do guarda-roupa. Aqui ficam algumas notas tiradas durante este encontro que durou cerca de 60':

- a ideia do cenário ser o céu veio do encenador e a decoradora inspirou-se em Jean-Honoré Fragonard (1732-1806), um pintor clássico, não num quadro específico, mas sim num detalhe dum quadro;

- o cenário é único, composto por vários paineis de madeira pintados com tinta de água (havia restrições financeiras e técnicas a respeitar - a peça será representada dentro de sala e no exterior estando prevista uma tournée por toda a França);

- o chão foi alvo de várias experiências com o objetivo de não destoar dos painéis verticais devendo refletir o céu e tendo em conta os jogos de luz - a ideia de partida não resultou e isso acontece pois há ideias que não funcionam, o que não faz mal, é algo bastante normal neste tipo de trabalho onde se experimenta e quando não funciona, passa-se a outra coisa;

- ninguém queria representar algo de concreto, optando-se igualmente por um cenário minimalista (é o mesmo ao longo de toda a peça);

-  o trabalho em torno do cenário passou por várias fases:  da ideia de partida (neste caso, uma ideia do encenador) passa-se ao local da representação,dos desenhos passa-se depois à maquete e por fim da maquete para a realidade - sabendo que o encenador foi o chefe, foi ele que decidiu (quando o encenador não tem ideias, o que pode acontecer, o decorador apresenta-lhe as suas, mas isso não foi o que aconteceu para esta peça);

- os pintores levaram cerca de cinco dias a pintar o cenário, uma imagem do século XVIII, de Fragonard, que se pretendia que fosse rapidamente reconhecida como sendo dele (uma pintura feita para ser vista de longe). No entanto, os pintores nunca esqueceram algo que lhes parece muito importante, a saber: a pintura quando é concebida como um cenário não tem por vocação existir sozinha, mas sim existir com atores à frente pelo que essa pintura não se deve ver demasiado. As nuvens não devem estar muito bem desenhadas, delineadas pois, como já se sublinhou, os atores é que são importantes. Outro aspeto importante prende-se com o facto de Fragonard, o pintor oitocentista ser apenas o ponto de inspiração e nunca o alvo a copiar;

- a responsável pelo guarda-roupa trabalhou com a equipa do cenário;
- a escolha das roupas e das cores pode e deve fazer-se tendo em conta as cores do cenário; 
- o guarda-roupa inspira-se parcialmente do século dezoito, há elementos que são atuais por vontade do encenador.

- tanto o cenário como o guarda-roupa acabam por não se guardar, deitam-se fora porque são frágeis, sobretudo em peças que estão vocacionadas para tournées.




  •  «Le Mariage de Figaro ou la Folle Journée» de Beaumarchais: representação de 22-11-2014 

Laissant à l’arrière-plan la charge progressiste du texte – écrit en 1778 et vu par certains comme annonciateur de la Révolution –, Jean-Paul Tribout a choisi de mettre à l’avant-scène le côté joyeux de cette pièce. Un parti pris pas vraiment étonnant car l’homme, popularisé au milieu des années 1970 par la série télévisée "Les Brigades du Tigre" dans laquelle il tenait le rôle de l’inspecteur Pujol, a de l’humour à revendre ! in http://www.saintgermainenlaye.fr/toutes-les-actualites/detail-decouvrir/article/decouvrez-une-nouvelle-version-du-mariage-de-figaro/, consultado a 15-11-2014.







quarta-feira, 8 de outubro de 2014

AUTO DA COMPADECIDA (contexto)


Sobre o autor
Ariano Suassuna é um escritor nascido em João Pessoa, Paraíba. Defensor da cultura da sua região, o autor de Auto da compadecida lançou o Movimento Armorial, que se interessava pelo conhecimento e desenvolvimento das formas de expressão populares tradicionais.

Importância do livro
Auto da compadecida é uma peça teatral em forma de auto (gênero da literatura que trabalha com elementos cômicos e tem intenção moralizadora). É um drama nordestino apresentado em três atos. Contém elementos da literatura de cordel e está inserido no gênero da comédia, se aproximando, nos traços, do barroco católico brasileiro. Trabalha com a linguagem oral e apresenta também regionalismo através da caracterização do nordeste.

Período Histórico
A peça foi escrita em 1955 e encenada pela primeira vez em 1956. Anos mais tarde, foi adaptada para a televisão e para o cinema, em 1999 e 2000 respectivamente.

Análise

A peça trata, de maneira leve e com humor, do drama vivido pelo povo nordestino: acuado pela seca, atormentado pelo medo da fome e em constante luta contra a miséria. Traça o perfil dos sertanejos nordestinos que estão submetidos à opressão e subjugados por famílias de poderosos coronéis donos de terra. Nesse contexto, o personagem de João representa o povo oprimido que tenta sobreviver no sertão, utilizando a única arma do pobre: a inteligência. 

Fica evidente o cunho de sátira moralizante da peça, através das características de seus personagens. O padeiro e a mulher são avarentos, deixando passar necessidade o empregado enquanto cuidam bem do cachorro. O padre e o bispo, gananciosos, utilizam da autoridade religiosa para enriquecerem. Todos estes são condenados ao purgatório com a interseção de Nossa Senhora. Já Severino e o cangaceiro, apesar de todos os crimes cometidos em vida, são poupados por serem considerados vítimas naquela situação: a seca, a fome e toda a difícil realidade os obrigaram a levar este tipo de vida.

A peça é uma síntese do modelo medieval com o modelo regional: trabalha o tema religioso da moral católica (se aproximando dos temas barrocos), mas inserido no contexto nordestino, ou seja, regional. Por ser um dos objetivos do movimento modernista trabalhar tendências mundiais de forma regional, adaptando-se a nossa realidade, a peça pode ser considerada como uma tendência modernista.


AUTO DA COMPADECIDA (resumo)


A peça é narrada pelo palhaço e a história se inicia quando Chicó e João Grilo tentam convencer o padre a benzer o cachorro de sua patroa, a mulher do padeiro. Como o padre se nega a benzer e o cachorro morre, o padeiro e sua esposa exigem que o padre faça o enterro do animal. João Grilo diz ao padre que o cachorro tinha um testamento e que lhe deixara dez contos de réis e três para o sacristão, caso rezassem o enterro em latim. Quando o bispo descobre, Grilo inventa que, na verdade, seis contos iriam para a arquidiocese e apenas quatro para paróquia, para que o bispo não arrumasse problemas.
Depois de toda a confusão sobre o enterro do cachorro, João Grilo arma com Chicó para também tirarem vantagem da situação. Manda Chicó enfiar moedas em um gato e esconder uma bexiga de sangue por baixo da camisa, para o caso de o primeiro plano falhar.
Como havia perdido seu animal de estimação e também era interesseira, João resolve vender o gato que “descomia” dinheiro para a mulher do padeiro, o gato no qual Chicó tinha colocado moedas. Quando o padeiro descobre, volta à igreja para brigar com João. Neste momento, estão reunidos todos na igreja, pois João estava entregando o dinheiro prometido ao padre, ao bispo e ao sacristão. 
Ouvem-se tiros e uma gritaria do lado de fora, era o cangaceiro Severino. Ele entrou na igreja, roubou o dinheiro e matou o bispo, o padre, o sacristão, o padeiro e a mulher. Na hora de matar João Grilo, este lhe dá de presente uma gaita abençoada por Padrinho Padre Cícero que teria o poder de ressuscitar as pessoas.
Para o cangaceiro acreditar, João dá uma facada em Chicó e estoura a bexiga com sangue; Chicó cai e João Grilo toca a gaita enquanto o amigo levanta dançando no ritmo da música. Severino, então, ordena a seu capanga que lhe dê um tiro e depois toque a gaita para que ele possa ir encontrar com Padre Cícero e depois voltar. O capanga obedece, atira, mas quando toca a gaita nada acontece. Chicó e João Grilo se atracam com o capanga e este leva uma facada. Quando os dois estão fugindo com o dinheiro que pegam do defunto Severino, o capanga reage e mata João Grilo.
No céu, todos se encontram para o juízo final. O diabo e Jesus apresentam as acusações e defesas. João então chama Nossa Senhora para interceder por eles. É o que ela faz. O padre, o bispo, o sacristão, o padeiro e sua mulher são mandados para o purgatório. Severino e o seu capanga são absolvidos e enviados ao paraíso. João simplesmente retorna a seu corpo.
Quando retorna, vê Chicó lhe enterrando, levanta e dá um susto no amigo. Depois de conseguir fazer Chicó acreditar que está vivo, os dois se animam e fazem planos para o dinheiro do enterro. Até que Chicó se lembra da promessa que fez a Nossa Senhora, que daria todo dinheiro caso João sobrevivesse. Depois de uma discussão, decidem entregar todo o dinheiro à Igreja.